quinta-feira, 2 de junho de 2011

CONCEBENDO OS FILHOS DO CORAÇÃO


Sabíamos que não seria fácil, já tínhamos uma noção da morosidade dos processos de adoção, mas precisávamos fazer tudo legalmente, era o caminho correto, então fomos ao fórum local e buscamos as informações. Modéstia à parte, quando decido me empenhar em um objetivo, sou uma leoa e meu marido me acompanhou na empreitada. Tínhamos que tirar muitas certidões negativas, na polícias civil, federal, enfim, várias certidões que nem me lembro direito. Juntamos vários documentos, comprovantes, papéis, papéis, papéis... Em tempo recorde levamos tudo em mãos para a primeira entrevista com o pessoal da vara de família, uma espécie de junta de pessoas que cuidam das questões de menores: psicólogos e assistentes sociais. Após uma série de questionamentos veio a pergunta crucial: "Quais as características da criança que procuram?" Foi um choque. Como eu poderia "escolher"? Quando engravidei de meus filhos eu não escolhi nada, eles vieram e eu os amei desde que soube da existência deles em meu ventre. Meu marido disse que desejava que fosse uma menina porque sabia de meu sonho de ser mãe de uma menina e já que iríamos adotar, que fosse a filha de meus sonhos. Concordei, porém não escolhi cor, idade, condição de saúde, nada. Disse para ela, a assistente, que iria reconhecer minha filha no dia que a conhecesse, e, assim como meus filhos biológicos, não escolheria suas condições físicas, características raciais ou qualquer outra condição. Disseram que visitariam nossa casa para nos conhecer melhor. Entre a parte formal, visita e a efetiva habilitação do casal à adoção foram, aproximadamente, 40 dias. Como morávamos num distrito de Belém, com fórum local, tudo foi muito rápido, éramos o único casal lá a encaminhar um processo de habilitação à adoção. Conseguimos entender o por quê de tantas certidões, perguntas, visitas, investigação sobre nossa vida: muitas adoções tomam um rumo muito diferente e não se destinam a dar um lar, educar e dar amor aos pequenos. Coisas como tráfico de crianças e outras coisas gravísimas acontecem, por isto a necessidade de saber a que família se está entregando um menor.
O processo foi finalizado e estávamos habilitados para adotar uma criança. E agora?
Resolvi me aproximar como colaboradora do abrigo de crianças abandonadas. Legalmente eu teria que aguardar ser chamada quando alguma criança estivesse disponibilizada à adoção (o que, diga-se de passagem, é muito demorado), mas paralelamente resolvi dar uma "forcinha" ao curso legal do processo.
Me apresentei no abrigo como profissional de uma empresa de muita credibilidade (e realmente sou), dizendo que gostaria de colaborar, mobilizar pessoas e recursos para ajudá-los e, então, busquei parceiros que promoveram melhorias no abrigo tais como pintura, conserto da piscina, entre outros. Mobilizei, também, meus colegas de trabalhos, arrecadamos dinheiro, fizemos uma linda festa de natal, presenteamos 73 crianças, teve apresenteação de teatro, distribuição de sorvetes, foi uma delícia! Ganhei, assim, a simpatia da Diretora do abrigo e consegui um acesso liberado para visitar quando quisesse, era só avisá-la. Pronto, era o que eu precisava: conviver com aquelas crianças para encontrar entre elas a minha filha tão esperada.
Um dia, após sair do trabalho, senti uma vontade louca de ir lá, e a diretora autorizou, apesar de já ser tarde e quase hora das crianças dormirem. Brinquei com os pequenos, como sempre fazia e, de repente, enxerguei lá longe uma menina de vestido bem simples, pé no chão, com o dedo indicador na boca, cabeça baixa, sendo levada pela mão por uma monitora, então perguntei: Quem é aquela criança? Posso conhecê-la? Então trouxeram Isadora, uma menina que acabara de completar 3 anos, que, diferentemente das outras crianças, não sorria, nem brincava. Quando a peguei no colo ela não teve nenhuma reação, só enconstou a cabeça no meu peito em silêncio. Naquele momento eu tive certeza que havia encontrado minha filha. Era aquela criança que eu queria receber com o desafio de fazê-la feliz.
De forma rápida busquei informações entre as monitoras, me contaram que ela chegou lá ainda bebê, com 5 meses, mas tinha um irmão, o Vitor, o que dificultava bastante o interesse das pessoas que desejam adotar porque a justiça procura não separar os irmãos e não são muitos que desejam adotar mais de uma criança.
Fui pra casa e a noite foi longa, não conseguia parar de pensar naquela carinha triste e, ao mesmo tempo, encantadora. Meu marido se desesperou porque fiquei deprimida. Eu não podia fazer ele aceitar duas crianças, mas ao mesmo tempo eu havia encontrado minha filha!
Uma semana depois, no meio da noite, meu marido me acordou e disse:"Eu te amo e faria qualquer coisa pra te ver feliz. Vamos adotar as duas crianças!". Pulei na cama, abracei meu marido e tive a certeza absoluta que Deus tinha me dado o melhor marido do mundo! Afinal, o ditado diz: Onde come um, come dois, come três, como quatro, depende de quem coloca o prato.
No dia seguinte fomos conhecer nosso filho Vitor, um menino de 4 anos forte, bonito, ativo, ou melhor, hiperativo! Sorridente e, aparentemente, mais feliz que Isadora. O abracei conversamos alguns minutos e sentimos que aquele também seria um filho muito amado. Ele era muito querido por lá, porque sempre foi muito carinhoso e obediente, diziam as monitoras. Por conta disto, ganhou uma bolsa numa escolinha de bairro que tinha lá perto. Era o único menino que já estava indo pra "faculdade" como elas diziam. Já sentimos orgulho dele, afinal, estávamos falando do nosso Vitor!
Estavam concebidos. Eles ainda não sabiam, não podíamos ainda dizer, mas em pouco tempo estariam recebendo em suas vidas uma família e nós, descobriríamos a partir dali, que receberíamos muito mais amor deles do que jamais havíamos sonhado em dar!

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